quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Iemen - O Mundo Proibido - Parte II

Sanaa, a capital do Iêmen, parece uma cidade de brinquedo. Daqueles brinquedos antigos de montar, feitos com  pequenos blocos de madeira que, colocados uns sobre os outros, se transformavam em casas e prédios. Esta foi a primeira impressão que tive ao ver de perto as construções em pedra que datam do século IV, na parte antiga da cidade. Os casarões, repletos de vitrais, ocupam uma área enorme. São cerca de 3 mil construções. Pena que a maioria já tem antenas de televisão no teto. Mas basta caminhar pelas vielas entre os prédios para fazer uma viagem sem escalas ao passado. Uma construção me impressionou muito: um castelo, que no passado foi residência de um sultão, construído em cima de uma rocha imensa. Forma indelével de se defender do ataque de tropas inimigas. Mais impressionante ainda é a maneira de se chegar ao castelo. Túneis foram construídos dentro da rocha, e hoje servem de passagem para quem quer conhecer o mausoléu por dentro. Nas ruas, também calçadas com pedras, encontramos ocasionalmente um ou outro morador. E algumas mulheres, todas vestidas com o baltho, uma túnica preta que as cobre da cabeça aos pés. Ao passar por nós, elas abaixam ligeiramente a cabeça, como se pudessem se esconder ainda mais. Regras de conduta de um país, e de uma religião, especialmente rigorosos com as mulheres (assuntos que serão abordados num próximo post). No Suq, mercado velho, é que Sanaa se revela. Tenho comigo que os mercados são os melhores lugares para se conhecer os costumes e tradições de um povo. E o mercado de Sanaa permite muito mais do que isso. Todas as cores, sabores e odores do oriente estão aqui. Ao alcance de todos os sentidos.Você vê, cheira, sente, se embriaga diante de tantas oportunidades. E tudo a granel! Pimentas, grãos, frutas, folhas.. você olha, avalia, pesa e leva pra casa. Os vendedores são extremamente simpáticos. De um, ganhei um pedaço de uma fruta bem brasileira: melancia. Algumas centenas de metros adiante encontramos o mercado das roupas. Predominam as grandes túnicas, lenços e véus coloridos. Um detalhe me chamou atenção. Numa loja estavam expostas vestidos coloridos, muito bonitos. Fiquei imaginando quem iria comprar, já que as iemenitas são obrigadas a usar o baltho. Mistério! Existem tambem muitas lojas onde são vendidas as jâmbias, aquelas adagas com uma curva na ponta. Todos os iemenitas usam uma!! Mais do que uma arma, a jâmbia (fala-se 'diâmbia') é considerada, no Iêmen, um símbolo de masculinidade. Até as crianças carregam uma na cintura. Os cintos de couro que as prendem na cintura são verdadeiras obras de arte. E a adaga, na verdade, não pode mesmo ser considerada uma arma. A lâmina é de lata. Mas o cabo, todo trabalhado, é de marfim. E custam pouquíssimo. Para fazer a matéria, comprei um cinto e uma adaga. Me lembro de ter pago algo em torno de vinte reais pelo conjunto! Me arrependo muito por não ter comprado um livro do alcorão, a bíblia dos muçulmanos. Encontrei, numa loja do mercado velho, um livro belíssimo, todo ilustrado e com capa de couro. Tambem custava pouco, mas o olhar furioso do vendedor me desencorajou a efetuar a compra. É que peguei o livro e comecei a folhear, como faria no Brasil, mas o vendedor interpretou isso como um desrespeito ao alcorão. E isso, no Iêmen, pode significar pena de morte. Quando percebi que o vendedor me fuzilava com os olhos e já começava a trincar os dentes de raiva, disfarcei, coloquei o alcorão de volta e me perdi no meio da multidão. A viagem estava apenas começando. E, decididamente, morrer ali, em praça pública, imolado pela fúria fundamentalista, não estava nos meus planos. Eu não sabia, mas o perigo real e imediato, ainda estava por vir. E ficamos expostos a ele na cidade sagrade de Marib, onde reinou a Rainha de Sabah. Mas isso eu conto depois.

 

5 comentários:

  1. Espetacular....! Parábens Raul! Sou uma grande admiradora sua.

    Beijos...!

    Wanessa BH/MG

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  2. Maravilhosa sua reportagem!!!!!!!!!


    Parabens.

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  3. O mundo muçulmano me facina, mesmo com todo esse fundamentalismo religioso a cultura do oriente médio é uma das mais ricas e milenares, quem sabe todo esse fundamentalismo tenha como pricípio justamente guardar a todo custo o pouco ainda que restou de uma cultura milenar sem traços desse mundo moderno. Essa ação pode ser criticada, mas também deve ser compreendida. Abraço Raulzinho, na próxima vez que passar por aqui quero saber mais sobe os mistérios culturais do Iêmen e continuarei acompanhando aqui seus posts.

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  4. Que bom que você está contando os bastidores dessa "aventura". Acompanhei a série e adorei a matéria! Muito interessante e até "meio absurda" a cultura iemenita... Parabéns!
    Continuarei acompanhando nos seus próximos posts.

    Cássia - Viçosa/MG

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  5. eu gostaria de acessar a reportagem, mas não esta disponivel.
    shey

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