quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Iemen - O Mundo Proibido - Parte III

Bastaram dois dias em Sanaa para esquecer todos os alertas sobre perigos no Iêmen. Andamos por vários lugares na cidade e só me lembro de um episódio esquisito. Estávamos gravando em um mercado onde se vendem folhas de kat (um vegetal que os iemenitas mascam e ficam letárgicos durante boa parte do dia) quando, de repente, nosso guia apareceu e literalmente nos arrastou para fora, praticamente correndo. Pedimos explicações mas ele jamais nos contou o que houve. Só sei que o sujeito estava apavorado. E estava visivelmente nervoso também no dia que saímos em direção a Marib, a cidade onde, meses atrás, oito turistas espanhóis tinham sido mortos num atentado com explosivos. Achei um exagero quando ele nos disse que seríamos escoltados durante todo o percurso. E também durante todo o tempo em que estívessemos na cidade.Uma escolta só para nós, dois jornalistas disfarçados de turitas! Me senti uma celebridade! Mas comecei a ficar realmente assustado quando vi o que era a escolta. Dois jipes com vários soldados muito bem armados e um outro carro com um canhão anti-aéreo. Não sei o que era mais assustador: a arma ou o cara que a manejava. No começo, os soldados foram gentis, mas quando comecei a gravar uma passagem (quando o repórter aparece falando) eles mudaram radicalmente. Não demorou para um oficial vir até nós e perguntar se eu era repórter de alguma tv estrangeira. Dissemos que não, que aquilo era para arquivo de viagem, que a gente fazia aquilo em todos os países. Ele pediu para ver as imagens e Henry, nosso repórter/produtor/cinegrafista, mostrou tudo. O que eu não sabia é que Henry, espertamente, já tinha trocado as fitas e estava mostrando só uma poucas imagens que havia feito segundos antes. Escapamos por pouco. Durante a viagem não fizemos mais nenhuma imagem. Quando chegamos a Marib a escolta foi reforçada por mais dois veículos de policiais de própria cidade. Se perderam a conta, vou relembrar. Eram dois jipes, mais um com canhão anti-aéreo e agora tinha mais dois! E esta escolta toda para dois ilustres desconhecidos brasileiros!!! Em vez de celebridade, agora me sentia um alvo ambulante. E os olhares de ódio que a gente capturava pelo caminho só reforçavam isso. Nosso 'discreto' comboio seguiu direto para as ruínas da cidade antiga de Marib, que viveu seu apogeu no ano 1000 AC. A Marib antiga fica no alto de um monte, como convinha à uma cidade construída para servir de fortaleza. Marib era rota obrigatória para as caravanas que vinham de todo o oriente atrás das riquezas do Iêmen, principalmente mirra, incenso e mel. Dali fomos para o templo da Rainha de Sabah. Estranho, né, mas o Iêmen, país ultra-machista, foi governado por uma mulher. Bilquis, a rainha de Sabah, é citada no Velho Testamento. Ela teria tido um encontro com o rei Salomão, cujos súditos ficaram espantados com o imenso tesouro transportado pela caravana da rainha. E também com a beleza estonteante de Bilquis. Se bem que aí, olha, sei não. Todas as mulheres da antiguidade são descritas como maravilhosas. Cleópatra, Nefertiti, Bilquis, todas beldades! Será possível que não tiveram nenhuma Carlota Joaquina ? Bão, mas vamos lá. O templo da Rainha de Sabah ainda está sendo escavado. Sete grandes colunas já estão visíveis e a escavação continua. Aliás, os tesouros arqueológicos do Iêmen estão por toda parte. E muitos são saqueados a luz do dia. Não foram poucos os vendedores ambulantes que vieram nos oferecer esculturas, pedras trabalhadas, brincos, pulseiras e colares antigos. Devo dizer que, embora tentado pela beleza das peças, não colaborei com o mercado negro da arqueologia iemenita. Já bastava o medo de ser preso por espionagem! Já era fim de tarde quando nosso inacreditável comboio militar cruzou a nova Marib, rumo ao hotel. Aliás, também uma fortaleza. O prédio antigo fica fora da zona residencial da cidade. Antes de chegar aos muros altos, passamos, em zigue-zague, por vários blocos imensos de concreto. Perguntei porque estavam ali e o guia explicou que era para impedir a passagem de possíveis carros ou caminhões-bomba. Antes não tivesse perguntado. Por precaução, antecipamos a saída. E deixamos o hotel de madrugada, em duas caminhonetes, na companhia de dois beduínos muito bem armados. O sol ainda não havia nascido quando começamos a travessia de duzentos quilômetros pelo deserto da Arábia

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