quinta-feira, 14 de abril de 2011

Os frutos da maldade

Até que ponto pode chegar a maldade humana ? Esta pergunta não me sai da cabeça. E martela mais forte desde que duas meninas foram mortas em Cunha, no interior de São Paulo. Josely e Juliana moravam com os pais e mais uma irmã, Betânia, num pequeno sítio. E tinham sonhos singelos. Josely, de dezesseis anos, queria ser manicure. Juliana, de quinze, dizia que, um dia, a mãe iria ve-la desfilando em uma passarela. O pai, seo  José, me contou que o nome da segunda menina, Josely, tinha sido dado por ele. Como eles queriam um menino, e veio uma menina, a mãe, dona Iracema, disse que ele podia escolher o nome. E ele escolheu Josely (a pronúncia é Josély e não Joselí) porque deriva de José. Simples. Como a vida da família. Como os sonhos das meninas. Como os sonhos de seo José e dona Iracema. Todos relacionados com o futuro de Juliana, Josely e Betânia, que acabou de completar dezoito anos. E agora está sozinha. Ela mostrou o quarto onde dormiam. Tem apenas um guarda-roupa e duas camas. Uma de casal, que ela dividia com Josely, e outra de solteiro, onde Juliana dormia. Tambem tem bichos de pelúcia, bonecas e alguns poucos cremes e perfumes. Era neste quarto que, já deitadas, elas conversavam e davam risadas, lembrando o que tinham feito durante o dia e planejando o dia seguinte. Vivendo assim, na companhia zelosa dos pais, na simplicidade de um sítio, no aconchego de uma casa pequena e modesta, na companhia de cães, galinhas, porcos e passarinhos, elas eram muito felizes. Parece pouco, mas só quem viveu algo parecido sabe como é  possível ser imensamente feliz assim. Esta felicidade, os sonhos, talvez até o futuro de quem ficou, tudo foi destruído por um canalha. 


Esta semana Ananias foi preso e confessou os crimes. É um canalha. Assim como o rapaz que invadiu a escola em Realengo, no Rio de Janeiro, e disparou contra dezenas de crianças. Conheci alguns personagens desta tragédia. Alunos que, por muito pouco, não estiveram na mira do atirador. Professores que agiram como heróis. Mães que buscaram desesperadamente pelos filhos. Tudo porque um cara que estava destinado a passar em branco pela vida resolveu assinar uma obra demoníaca e, assim, entrar tristemente para a história. Como entender, e perdoar, os Ananias, Wellingtons e tantos outros que matam por matar ? Ao contrário de seo José, o pai das meninas de Cunha, que tem uma religiosidade e uma grandeza de espírito muito maiores que as minhas, eu não entendo e não perdoo. Entendo que eles agiram assim movidos somente pela maldade. A mesma maldade que se enraiza no coração dos homens e aparece de tempos em tempos, como que para nos lembrar: 'eu existo. Sou eu que estou por trás de um genocídio, do índio queimado, dos meninos mortos na Candelária, das mortes de Mércia, Vanessa, dos homicídios, latrocínios, estupros, espancamentos, enfim, sou eu, a maldade, a razão de tudo isso.'  E ela não se ampara em credos, religiões, convicções, fanatismo, em nada! Ananias e Wellington não eram fanáticos, não eram lunáticos, não eram doentes, não eram petistas, não eram tucanos, não eram flamenguistas nem corintianos. Não eram nada. Eram maus. Só isso. Seo José por certo não concorda comigo. Ele tem um coração grande demais. Acha que todas as pessoas são frutos da mesma árvore. E que esta árvore só dá boas sementes. Eu penso diferente. Acho que os frutos dependem sempre da maneira como a árvore é cultivada. Sabe aquela história, de que todos temos dois animais famintos no coração ? Um se alimenta de bondade. E o outro, de maldade. Aquele que voce alimentar mais, crescerá mais, e tomará conta de seu coração. Como tomaram conta do coração de Ananias e Wellington.