sexta-feira, 27 de novembro de 2009

O Colecionador

Sempre soube que existem bilionários excêntricos. Que gostam de colecionar carros, iates, mulheres. Mas nenhum é páreo para o Sheikh Faisal bin Qassim Al Thani, um dos homens mais ricos do Qatar. E, por tabela, um dos mais ricos do mundo. O Sheikh Faisal pertence à família Al Thani, que manda no Qatar e é simplesmente dona da terceira maior reserva de petróleo que existe no planeta. Quando, anos atrás, o barril de petróleo patinava entre 8 e 12 dólares, a família Al Thani já era muito feliz. Imagine hoje. E sabe o que o Sheikh Faisal mais gosta de fazer com parte do dinheiro que tem ? Colecionar. Parece que desde criança ele já tinha esta mania. Mas aí ele foi crescendo, o preço do petróleo foi aumentando, os dólares começaram a dar em árvores e ele pensou: vou aumentar minhas coleções!! Dia desses viajei ao Qatar para cobrir uma conferência sobre educação. E descobrir outras pautas pelo caminho. No último dia tive acesso ao palácio do Sheikh Faisal. Um feito, porque jamais uma equipe de tv da América Latina tinha entrado na residência do homem. O palácio foi especialmente construído, em 1992, para abrigar as coleções do maior colecionador do mundo. É isso mesmo! Ninguém neste mundo tem uma coleção tão grande e diversa como o Sheikh das Arábias. O palácio é todo feito de pedras e tem o formato de um castelo. Ou uma fortaleza, já que abriga tesouros inimagináveis. No total, são 20 mil peças. A maioria absoluta é relacionada com a história do oriente. A primeira sala que vimos foi a das armas. Todas ficam dentro de armários de vidro climatizados, para evitar fungos. São espadas, adagas, espingardas, floretes, enfim, um arsenal histórico de valor incalculável. Em um canto, uma armadura que pertenceu a Saladino, o maior conquistador do Oriente. Em outro, uma espada com cabo de marfim e a lâmina adornada com ouro e prata. Mais alguns passos e estamos diante de armas usadas pelos guerreiros mongóis de Gengis Khan. Em outro armário, uma espada usada na Índia para decapitar os inimigos. Ao lado de outra, tambem indiana, usada para cortar as mãos dos ladrões.  Dali passamos para a ala das vestes. Um passeio pela história de cada país do oriente. Roupas usadas por reis, rainhas, sheikhs e soberanos de todos os naipes. Não me lembro de ter visto nenhuma que não tivesse algum adorno de ouro, prata ou diamante. Para realçar as roupas, a maior parte foi vestida em manequins. Um deles, feminino, usa um véu cobrindo o rosto. Detalhe: o véu é todinho de ouro (primeira foto). Uma sombrinha indiana, do tamanho de um guarda-sol, também brilha em dourado por causa da decoração cheia de brilhantes e ouro. O Sheikh tem também uma coleção com 200 carros antigos. Inclusive o primeiro carro fabricado no mundo (foto abaixo). Os carros ficam na mesma ala que abriga uma coleção de barcos e navios que, séculos atrás, singraram os mares do oriente. A coleção de motos antigas é mais 'modesta'. São 15 motocicletas. A 'estrela' é a moto que foi usada por Peter O'Toole nas gravações de Lawrence da Arábia. O Sheikh Faisal coleciona ainda fósseis. Vimos uma cabeça imensa de dinossauro, ao lado de 4 ovos (de dinossauro, off course), datados de 100 milhões de anos. Além de papiros, livros antigos (tem o menor e o maior alcorão do mundo), jóias, tapetes (persas, iranianos, chineses), pérolas, enfim, o homem coleciona tudo que o dinheiro pode comprar. Ele é dono da maior pérola já pescada no Qatar. Do tamanho de uma bola de bilhar (foto abaixo) .Para guardar a preciosidade, ele mandou fazer uma ostra de ouro maciço! Dificil saber o que vale mais. E é uma coleção particular mesmo! O museu não é aberto à visitação pública. Percorremos o palácio durante 3 horas e ainda ficou faltando muita coisa para ser vista e mostrada.

Para assistir a reportagem, basta clicar abaixo:



E este post faço questão de assinar. Em árabe, off course. Desculpa aí.

Ass:  راؤل أنتوني ديس فيله

 

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Iemen - O Mundo Proibido - Parte III

Bastaram dois dias em Sanaa para esquecer todos os alertas sobre perigos no Iêmen. Andamos por vários lugares na cidade e só me lembro de um episódio esquisito. Estávamos gravando em um mercado onde se vendem folhas de kat (um vegetal que os iemenitas mascam e ficam letárgicos durante boa parte do dia) quando, de repente, nosso guia apareceu e literalmente nos arrastou para fora, praticamente correndo. Pedimos explicações mas ele jamais nos contou o que houve. Só sei que o sujeito estava apavorado. E estava visivelmente nervoso também no dia que saímos em direção a Marib, a cidade onde, meses atrás, oito turistas espanhóis tinham sido mortos num atentado com explosivos. Achei um exagero quando ele nos disse que seríamos escoltados durante todo o percurso. E também durante todo o tempo em que estívessemos na cidade.Uma escolta só para nós, dois jornalistas disfarçados de turitas! Me senti uma celebridade! Mas comecei a ficar realmente assustado quando vi o que era a escolta. Dois jipes com vários soldados muito bem armados e um outro carro com um canhão anti-aéreo. Não sei o que era mais assustador: a arma ou o cara que a manejava. No começo, os soldados foram gentis, mas quando comecei a gravar uma passagem (quando o repórter aparece falando) eles mudaram radicalmente. Não demorou para um oficial vir até nós e perguntar se eu era repórter de alguma tv estrangeira. Dissemos que não, que aquilo era para arquivo de viagem, que a gente fazia aquilo em todos os países. Ele pediu para ver as imagens e Henry, nosso repórter/produtor/cinegrafista, mostrou tudo. O que eu não sabia é que Henry, espertamente, já tinha trocado as fitas e estava mostrando só uma poucas imagens que havia feito segundos antes. Escapamos por pouco. Durante a viagem não fizemos mais nenhuma imagem. Quando chegamos a Marib a escolta foi reforçada por mais dois veículos de policiais de própria cidade. Se perderam a conta, vou relembrar. Eram dois jipes, mais um com canhão anti-aéreo e agora tinha mais dois! E esta escolta toda para dois ilustres desconhecidos brasileiros!!! Em vez de celebridade, agora me sentia um alvo ambulante. E os olhares de ódio que a gente capturava pelo caminho só reforçavam isso. Nosso 'discreto' comboio seguiu direto para as ruínas da cidade antiga de Marib, que viveu seu apogeu no ano 1000 AC. A Marib antiga fica no alto de um monte, como convinha à uma cidade construída para servir de fortaleza. Marib era rota obrigatória para as caravanas que vinham de todo o oriente atrás das riquezas do Iêmen, principalmente mirra, incenso e mel. Dali fomos para o templo da Rainha de Sabah. Estranho, né, mas o Iêmen, país ultra-machista, foi governado por uma mulher. Bilquis, a rainha de Sabah, é citada no Velho Testamento. Ela teria tido um encontro com o rei Salomão, cujos súditos ficaram espantados com o imenso tesouro transportado pela caravana da rainha. E também com a beleza estonteante de Bilquis. Se bem que aí, olha, sei não. Todas as mulheres da antiguidade são descritas como maravilhosas. Cleópatra, Nefertiti, Bilquis, todas beldades! Será possível que não tiveram nenhuma Carlota Joaquina ? Bão, mas vamos lá. O templo da Rainha de Sabah ainda está sendo escavado. Sete grandes colunas já estão visíveis e a escavação continua. Aliás, os tesouros arqueológicos do Iêmen estão por toda parte. E muitos são saqueados a luz do dia. Não foram poucos os vendedores ambulantes que vieram nos oferecer esculturas, pedras trabalhadas, brincos, pulseiras e colares antigos. Devo dizer que, embora tentado pela beleza das peças, não colaborei com o mercado negro da arqueologia iemenita. Já bastava o medo de ser preso por espionagem! Já era fim de tarde quando nosso inacreditável comboio militar cruzou a nova Marib, rumo ao hotel. Aliás, também uma fortaleza. O prédio antigo fica fora da zona residencial da cidade. Antes de chegar aos muros altos, passamos, em zigue-zague, por vários blocos imensos de concreto. Perguntei porque estavam ali e o guia explicou que era para impedir a passagem de possíveis carros ou caminhões-bomba. Antes não tivesse perguntado. Por precaução, antecipamos a saída. E deixamos o hotel de madrugada, em duas caminhonetes, na companhia de dois beduínos muito bem armados. O sol ainda não havia nascido quando começamos a travessia de duzentos quilômetros pelo deserto da Arábia