quinta-feira, 14 de maio de 2009

As várias vítimas de um mesmo crime

A doença do momento é a gripe suína, ou gripe A, como rebatizaram agora. Mas nenhuma pandemia foi ou é mais potencialmente mortal do que a Aids. Simplesmente porque, apesar de várias e eficientes formas de prevenção, o contágio continua incontrolável. E a doença ainda é incurável. No entanto, a Aids é relegada a um segundo plano na mídia. O motivo ? Ibope! É isso mesmo! Não que o Instituto que mede a audiência (será que mede mesmo ?) impeça a divulgação, nada disso! É que reportagens sobre a doença ou sobre HIV positivos despencam no Ibope. É fato! Ninguem sabe se os telespectadores não gostam do tema, mas o fato é que o rejeitam. E, infelizmente, o jornalismo também é refém da audiência. O Domingo Espetacular, porém, ainda tenta vencer esta resistência e está produzindo uma reportagem sobre o assunto. A matéria está sendo feita por uma equipe do Rio de Janeiro mas fui chamado para contribuir, fazendo uma entrevista no CDP (Centro de Detenção Provisória) em Americana, no interior de São Paulo. O entrevistado é soropositivo. Um homem de 45 anos. Açougueiro. Pessoa simples. Do bem, pelo que pude perceber na entrevista. Ele contraiu o vírus mantendo relações com a própria esposa que, por sua vez, tinha sido contaminada através de uma transfusão de sangue. Feita num hospital público. Bem, este nosso personagem está preso há seis meses e vai ser julgado por tentativa de homicídio. O crime que ele cometeu ? Contaminou outras duas mulheres. A história é longa, mas vou resumir. A esposa dele morreu dois anos depois da contaminação. Ele fez exames para ver se estava com HIV mas, com medo, não foi pegar os resultados. E voltou a namorar. E, nestes namoros, contaminou as namoradas. E agora está sendo processado por elas. Uma promotora levou as denúncias adiante. E uma juíza acolheu as denúncias. E o homem está preso, aguardando julgamento. Julgamento que vai dar o que falar. Porque existem muitas perguntas subjetivas envolvidas. Ele é culpado pela contaminação das moças ? Claro que sim. Mas ele queria matá-las ? Eis a questão. Ele diz que as contaminou por ignorância. Achava que a contaminação só aconteceria se houvesse ejaculação. E, por isso, na hora H, ele ejaculava para fora. O advogado de defesa entende que ele deu azar porque a denúncia foi feita por uma promotora. E caiu nas mãos de uma juíza. Ele acha que houve um certo corporativismo. Mas admite que o cliente cometeu um crime, inclusive previsto no código penal: o de transmitir intencionalmente uma doença contagiosa. Bom, eu, do lado de cá, entendo que ele cometeu um crime. Qual foi, cabe à justiça definir. Agora, a pergunta que não quer calar: e o hospital público onde foi feita a transfusão de sangue ? Ali dentro não foi cometido nenhum tipo de crime ? Será que não estamos falando de várias vítimas e de um único criminoso ?

Um comentário:

  1. Com certeza os valores estão meio invertidos nesta história toda! Mas de qualquer forma, quem vai sair perdendo nós já sabemos que são os contaminados... É o Brasil do andar de baixo, ou alguém ainda acha que o culpado será o HOSPITAL que contaminou a esposa do detento?...
    Sucesso, Raul!!!
    Sua fã NºZero!!! rs
    Cássia - Viçosa/MG

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